quarta-feira, 3 de junho de 2009

Sobre A Morte E O Morrer De Rubem Alves

Fotografia: Ernane Faustino - S/T
“Eram 6h. Minha filha me acordou. Ela tinha três anos. Fez-me então a pergunta que eu nunca imaginara: "Papai, quando você morrer, você vai sentir saudades?". Emudeci. Não sabia o que dizer. Ela entendeu e veio em meu socorro: "Não chore, que eu vou te abraçar..." Ela, menina de três anos, sabia que a morte é onde mora a saudade. (...) Permanecemos humanos enquanto existe em nós a esperança da beleza e da alegria. Morta a possibilidade de sentir alegria ou gozar a beleza, o corpo se transforma numa casca de cigarra vazia”.

Lembrei-me desse texto do magnífico Rubem Alves sobre a morte. Ele tem uma visão menos egoísta, mais ampla acerca da morte, e nos remete a um outro ponto de vista sobre tentar a custa do sofrimento, manter uma vida que não mais vive. Pela sua habilidade de escrita, parece nos convencer sobre optar pela eutanásia, em circunstâncias de dor e sofrimento na cama de um hospital ser nada além do que uma forma de morrer em paz para aqueles que padecem.

A morte nunca deixa de causar angustia e sofrimento aos que ficam. Lacunas de profunda saudade e a sensação de dor sentimental eterna. Partindo dessa visão de Rubem Alves, imagino a minha tia. Ela foi aberta duas vezes em uma mesa cirúrgica, na tentativa da sua vida não fosse ceifada. Não sei se ela sentiu dor em algum momento. Não sei se ela clamou pela morte, mas pela serenidade em que levou por toda a sua vida, talvez ela quisesse ter a oportunidade de escolher entre morrer em uma mesa cirúrgica (num sofrimento profundo e solitário), talvez ela quisesse morrer junto aos seus.


79 anos, tia Maria Marques, irmã mais velha de minha mãe.

Texto na íntegra de Rubem Alves: http://www.releituras.com/rubemalves_menu.asp

Um comentário:

Juliana disse...

Lembrei do meu avô. Que sempre considerou o Natal uma data importante. E essa data, o acompanhou, até ano passado, quando nessa mesma data, ele se foi.

Seu último parágrafo, de certa forma, ficou lindamente escrito. Serenidade tamanha que delonga pelas tuas palavras e que faz, um pouco, a reflexão, e a saudade, ficarem mais brandas.

Meus pêsames.
Um grande abraço.